Sempre que passo tempo contigo, acabo assim, em lágrimas. Desta vez, não foi diferente.
Você sempre soube de tudo desde o início e, hoje, saio com aquela sensação de medo e alívio. Medo por perceber o quanto "sua menina" se perdeu enquanto "trabalhava" para Você (e isso não tem nada a ver com sua "chefia" e direção) e, ao mesmo tempo, alívio por sua paciência e espera por mim, me retirando deste caminho tão cheio de tarefas, resultados, eficiência e me desacelerando para poder lhe perceber.
As circunstâncias em si não eram as melhores. Eu carregava dentro do meu peito muita tristeza pelas perdas da vida. Também não me ensinaram a lidar com meus sentimentos, então quando eu ponderava as coisas e colocava na balança, via que não fazia muito sentido parar, observar e curtir o que doía dentro do peito. Sei lá, de certa maneira, estar ocupada preenchia minha agenda, minha mente e eu não pensava muito nas tristezas, decepções e frustrações.
Assim, pelo menos, eu era útil. E sentir-se útil me trazia um sentimento bom, de quem alcança resultados. Mesmo que sejam efêmeros. Sim, eu fugia, me escondia, burlava. Mesmo que você sempre me achasse e quisesse conversar, esse caminho era menos dolorido. Eu realmente acreditava nisso e naquele momento, confesso que preferi seguir o que EU achava. Era melhor ver a alegria no rosto das pessoas, ter alguma motivação e metas a cumprir, realizar tarefas importantes do que viver na tristeza.
Eu também sabia que estavas comigo e cuidavas de mim, mas como já confessado, não queria ouvir muita coisa de ninguém (nem sua!), porque no momento da dor, a gente ouve tanta besteira e raras palavras de sabedoria que eu EU escolhi me fazer de surda e prosseguir. E nessas horas você também não falou nada. Bom, eu não ouvi.
Era uma escolha consciente, eu sei. Ponderei várias situações e tinha certeza que não estava fazendo nada de errado. Não ia machucar ninguém e minha dor seria aliviada. Havia algo de errado nisso? Por lhe conhecer, também sabia que isso não iria lhe ofender nem lhe desonrar - diretamente -, mas também não lhe perguntei (confesso de novo!).
Esqueci que seus planos e pensamentos são bem maiores que os meus e me adaptei aos meus planos, já que eles eram confiáveis e eu tinha calculado cada detalhe. Era tudo palpável, visível e seguro! Neste caso, não era uma escolha por falta de amor a Ti, nem uma rebeldia ou desobediência intencional, era só uma questão de alivio da dor mesmo, de refugiar-me em algum lugar seguro. Não percebi que estava caindo na armadilha do "meu coração enganoso" e ter decidido assumir o controle - e as consequências - da minha vida, que já estava ruim demais.
A bem da verdade é que eu sabia que você era/é Amor, Alegria, Paz, Ordem, Sabedoria, Conforto... e justamente por saber disso que não entrava na minha mente (pequena) que você saberia por quais terrenos eu estava andando se só havia tristeza, dor, rancor, solidão, frustração, cansaço. Era muito claro pra mim que esses dois caminhos não ocupavam o mesmo espaço, por isso eu lhe contava tudo e até lhe detalhei todos meus planos, mas seguiria a risca meus planos e não ouviria sua opinião porque o que eu estava sentindo não fazia parte de você nem dos caminhos que você percorria. Você era um ótimo amigo, mas não poderia me ajudar naquele momento.
Eu reconhecia que todos os milagres que ocorreram em minha vida vinham de seus planos infalíveis e sempre fui grata a você por todos eles: as viagens incríveis, os amigos que você trouxe, o sustento diário, as conversas profundas e reflexivas com pessoas que também andavam com você, o encontro com Daniel, os frutos e crescimento do meu trabalho, as pessoas que me ajudavam crescendo com você...(eram tantos!), mas você não teria um plano melhor do que o meu para aquela circunstância. Eu me alegrava sim com seus feitos, mas a tristeza parece que tinha se instalado e eu iria lutar e trabalhar com todas as minhas forças para me livrar dela.
Até que fui surpreendida! Que susto! Enquanto eu chorava, de tanto trabalhar e de cansaço, você pegou na minha mão. Esse seu toque foi milagroso. Sem UMA palavra pronunciada parecia que você entendia sim o que eu estava sentindo. Foi MUITO estranho! Parece que um Vento entrou dentro de mim e mexeu com tudo. Tirou tudo do lugar. Quando tudo estava organizado eu não estava conseguindo encontrar a Alegria, imagine agora com tudo bagunçado?! Ficou uma confusão. Porém você não soltou minha mão e também não me deixou fazer nada. De alguma maneira aquilo me deixou quieta e fiquei só observando.
O problema é que você já sabia que eu não sou muito adepta a bagunça e isso realmente iria me deixar conturbada. Olhava para aquela confusão e queria arrumar. Em contra partida, não queria entrar "em casa" e ver o tamanho da bagunça. Mas para arrumar, teria que entrar. Que medooo! Eu estava tão cansada e perdida que o que eu mais queria, lá no fundo, era alguém segurando minha mão. E você sabia disso, por isso segurou.
Entramos juntos e, quando vi, você se sentou e ficou me olhando com aquele seu olhar cativante, envolvente, e ficou me esperando. Eu não conseguia me mover para arrumar nada, só queria que alguém me olhasse exatamente daquela maneira, me percebesse, me ajudasse. E você também sabia.
Constrangida, porque você já estava sabendo demais e eu sou muito reservada, eu achei que tinha lhe colocado numa furada e pensando rápido decidi sair novamente. Você não, você ficou lá dentro.
Lá fora, percebi que eu estava parada fazia muito tempo. Apesar de lembrar das conversas, dos milagres, das tarefas, dos resultados, eu parei exatamente onde me perdi e comecei a sentir aquela dor horrorosa de novo. Percebi também que tudo o que se passou foi você fazendo por mim e me dando um tempo para respirar um pouco.
Fiquei chocada! Você não estava muito preocupado se eu era útil, eficiente ou se dava conta de tudo. Você foi fazendo tudo para que eu me sentisse melhor enquanto prestava atenção em meu coração e no que eu sentia. Você sabia que eu não estava bem, me fez parar e mesmo assim cumpriu tudo o que eu havia planejado só para alegrar meu coração. (Essa foi a parte mais difícil de ver!)
Por mais difícil que fosse para eu entender (e a verdade é que até hoje não entendo) você sabia o que eu estava sentindo desde o começo. Você, só você, sabia do que eu precisava. Você sabia que eu queria colo, queria descansar e chorar, queria desabafar, queria entender porque estava me sentindo daquele jeito. Você também sabia que se meus planos fossem realizados, eu me alegraria, mesmo que não fosse a Alegria verdadeira que você tinha em suas mãos. Você sempre soube! Sabia que não queria ouvir nada nem ninguém, que queria me esconder e sumir. Sabia que não queria sentir aquilo, mas era somente aquilo que eu sentia. Você sabia!! E sabia, porque estava comigo, do meu lado. E você respeitou tudo isso, me deu um tempo, e até deixou que eu achasse que eu estava no controle de tudo, sendo que era você fazendo tudo para mim.
Quando percebi tudo isso, entrei de volta correndo. Queria lhe abraçar e dizer obrigada! Mas lá dentro ainda tava tudo bagunçado e isso me deixava irritada, porque estava tudo muito sujo e cheio de poeira. Você não era digno de um lugar daquela forma. Principalmente agora, depois desta descoberta. Só que lá dentro, pela primeira vez na minha vida, o desejo de lhe abraçar e ficar com você foi maior que organizar a bagunça toda. Eu ainda tinha receio da sua reação, de suas palavras, de mim mesma (porque sou muito, muito, muito medrosa), mas eu entrei com tudo.
O engraçado é que, naturalmente, eu lhe daria um abraço apertado, um beijo no rosto, agradeceria e iria arrumar tudo, mas (pela primeira vez também) vi que você se sentia em casa e estava bem instalado. Ainda pensei fortemente em organizar, pelo menos, algumas coisas, para que você se sentisse mais a vontade, mas seu abraço foi tão acolhedor, tão respeitador, tão "sinto muito, querida", tão companheiro, que me esqueci da casa - literalmente. E outra vez você me mostrou que não ligava para meu trabalho e aquela bagunça toda, porque você só queria estar comigo.
Depois, adormeci e descansei (pelo menos, por um tempo). Quando acordei, estava tudo no mesmo lugar. A bagunça continuava ali e você não largou da minha mão nem enquanto eu dormia. Seu olhar era cada vez mais envolvente e protetor, e você não se preocupava em falar nada, só em ficar ao meu lado. Tinha tanta coisa a ser feita (dentro e fora) e você nem se preocupava com elas.
Ficamos ali muito tempo. Não sei te dizer quanto. Era recorrente minha preocupação com "as coisas" e eu não conseguia parar de falar e fazer várias perguntas, como: "será que o tempo tá passando?", "onde está minha agenda?", "Você não vai arrumar a casa?", "o que temos para comer hoje?", "onde está toda aquela gente que eu cuidava?". Você sempre em silêncio me abraçava forte contra seu peito e era como se dissesse: "Psiiiiu... eu estou aqui com você. Acalme-se. Está tudo bem. Tudo sob meu controle. Não se preocupe.". Foram muitos e muitos abraços silenciosos e quando me dei conta, eu já estava bem mais quieta e com poucas palavras e preocupações (mas ainda existiam, só tinham baixado a poeira).
Sempre inquieta, busquei algo para FAZER e passei a observar seu silêncio. Achei curioso! Você não se incomodava com o silêncio. Você o dominava. Pelo seu olhar, entendi que tinha feito uma boa escolha. Era mesmo para lhe observar em silêncio.
Comecei a aprender algumas coisas e anotar.
As vezes, você enviava o Vento para bagunçar a casa. Quando ele bagunçava tudo, eu parava e entrava para arrumar. Era quando eu lhe via e tinha tempo com você e recebia seu abraço. Outras vezes, o mesmo Vento, ao invés de bagunçar, arrumava a casa. Assustada, eu entrava para examinar e aproveitava para descansar um pouco e também conversava um pouco contigo. De uma forma ou de outra, você sempre dizia que meu abraço era único e nunca esqueceu de dizer o quanto me amava.
Eu nem me dava conta que você só queria desfrutar da minha presença, conversar, me divertir, cozinhar pra mim, me dar colo. Pelo contrário, eu achava (desde criancinha) que eu tinha que fazer tudo, estar sempre ocupada e me esforçar ao máximo pela perfeição enquanto trabalhava pra você. Afinal, você é perfeito e qualquer erro poderia lhe desagradar.
Misteriosamente (destes mistérios que não cabem neste mundo), você continuou me ensinado no silêncio e quando me dei conta, já havia muita coisa arrumada na casa. Foi estranho ver aquilo. Eu queria saber como era possível, mas cada dia que se passava (sei lá se você conta os dias) eu queria mais e mais de você e do seu silêncio. Não queria mais me distrair com a casa, nem com a bagunça dela. Você continuava do meu lado, me deu colo todos os dias, me alimentou, me lavou, me envolveu e a casa foi se organizando. Ainda é engraçado lembrar de tudo isso, mas hoje eu já não pergunto mais como ou por que você fez (e faz) isso.
Me arrisquei a olhar pra fora e percebi que você também conseguia controlar tudo. Não só "as coisas" que as pessoas se preocupam, mas, principalmente, ao que elas sentiam. E da mesma forma que você estava comigo lá dentro, estava com elas lá fora. É estranho mesmo. Nunca vou conseguir entender. Mas eu vi.
Foi nesse momento (exatamente neste momento!) que relaxei e só conseguia olhar pra você e em como você era/é especial. Lembro que deixei de observar a casa e de olhar lá pra fora pela janela. E saíram as minhas primeiras palavras depois desse tempo de silêncio (que eu nunca vou saber quanto durou): "Por que eu me preocupei tanto em fazer tantas coisas e não ficava com você?". Você sorriu e foi um sorriso diferente. Talvez eu tenha entendido sobre estar em sua presença.
A esta altura, eu não precisava mais de suas palavras (apesar de sentir saudade de sua linda voz), eu já sabia de algumas coisas sobre você e seu coração por meio do seu olhar, assim como, muitas vezes, entendo Daniel só pelo olhar dele. E eu olhava pra mim e já nem me reconhecia. Como você consegue?
O tempo com Você mudou muita coisa e queria que eu saísse um pouco e voltasse para minha rotina, mas confesso que tive medo. Porque eu já sabia que as coisas lá de fora mexiam com as de dentro. Eu sabia que você tinha ambos os lados em suas mãos, mas eu tinha medo e você sabia. Você só estava me convidando a não ter medo!
O fato é até agora não consegui sair. Estou aqui, enclausurada. E mais uma vez, você está respeitando meu tempo e me ajudando a olhar pra fora e esquecer do medo. Eu quero sair, mas ainda estou crescendo, você sabe! Só não quero mais lhe perder de vista.
O bom é que hoje eu sei que você cuida muito melhor que eu daqui de dentro e de lá de fora. Você sempre saberá de tudo, sempre! Só não posso esquecer disso!